quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Jornada de trabalho de seis horas


O servidor, em seu trabalho diário, sofre intenso desgaste mental e emocional. Sua função exige: ouvir, se comunicar com várias pessoas ao mesmo tempo, ler, entender, interpretar, raciocinar e redigir textos com rapidez e sem erros. Deve estar muito atento à leitura, pois redigir e analisar um processo toma tempo e demanda energia mental. Ao final de uma jornada de 6 horas a mente tem diminuída sua capacidade de assimilar informações, e pequenos erros ou descuidos por causa da fadiga mental podem ter conseqüências desastrosas para o cidadão e a sociedade. Os especialistas em saúde do trabalhador detectaram que após horas trabalhando em frente à tela de computador, o usuário não consegue processar as informações, é o chamado “espelhamento”. É como ler um livro pensando em outras coisas, lê-se varias páginas e não se lembra de nada.

Além do desgaste mental, há o desconforto físico, de ficar horas em cadeiras e mesas fora das condições ergonômicas ideais para o trabalho. Mas o servidor do TJMG também sofre intenso desgaste emocional. Os processos que chegam ao TJMG estão repletos de sentimentos de revolta, vingança, ódio, mágoa ‒ histórias de muita dor, como nos homicídios, crimes passionais movidos por ódio ou vingança, a violência sexual contra crianças, e tantas histórias que revelam o lado obscuro e perverso do ser humano. Diversos servidores relatam que ao redigir um processo, se emocionam ou se revoltam com os fatos acontecidos. Muitos oficiais de justiça vivenciam histórias da injustiça no cumprimento de mandatos como: Retirar uma máquina de lavar roupas de uma pobre lavadeira que atrasou prestações, se a máquina é a sua fonte de renda e objeto de trabalho. Retirar uma família de uma casa deixando-os ao relento, na chuva, cumprindo ação de reintegração de posse.

Nas secretarias, cartórios, fóruns, as mesas estão abarrotadas de processos. Ao terminar uma pilha, já tem outra esperando. Trabalho interminável como no mito de Sísifo, que é condenado a subir uma pedra até ao alto de uma montanha, mas ao chegar ao topo a pedra rola para baixo e ele tem de repetir seu trabalho, por toda eternidade.

No outro lado do balcão, diversos olhares persecutórios, encarando quem faz o serviço interno, como se este servidor tivesse que parar seu trabalho, para ajudar no atendimento do balcão. Ao fazê-lo, interrompe o fluxo de pensamentos e ao voltar à mesa tem que começar a leitura de novo, pois o raciocínio se foi. Como uma bolha de sabão que explode, o pensamento se esvai, desaparece.

O servidor também tem de manusear processos antigos, pesados, no alto de prateleiras, com fungos e bactérias. “Ufa! Que sufoco”. E ainda dizem que servidor trabalha pouco. Com a Meta 2, a solução apresentada pelo CNJ é aumentar a jornada de trabalho de 6 para oito horas, para “aumentar a produtividade” e cumprir as metas. Reparem na forma perversa que esta meta é apresentada nos comerciais de televisão, subliminarmente culpando o servidor pela morosidade da justiça. Processo judicial, não é objeto produzido de forma industrial, cada processo deve ter sua análise feita de forma criteriosa, deve estar bem redigido, e isto toma tempo.

Manter a jornada de 6 horas, mais que uma questão de direitos adquiridos, é uma necessidade absoluta para manter a saúde do trabalhador e a qualidade do serviço público. No mínimo, esta escolha da jornada de seis para oito horas, TEM DE SER OPCIONAL, e que haja uma boa compensação financeira. Entretanto muitos trabalhadores escolheram o serviço público como profissão por causa da jornada, que permite ter mais tempo para o lazer, família, estudos ou outras atividades.

Enquanto as centrais sindicais lutam pela redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas diárias, para aumentar a empregabilidade e proporcionar mais lazer ao trabalhador que cumpre 8 horas diárias e 4 horas aos sábados, o serviço público, na contramão da história quer impor o aumento da jornada, tirando dos servidores direitos adquiridos ao longo do tempo. Aos sindicatos cabe a defesa intransigente dos direitos dos trabalhadores e garantia da saúde física, mental e emocional do servidor no ambiente de trabalho.


Arthur lobato
Psicólogo