segunda-feira, 21 de maio de 2018

Palestrantes apontam saídas para degradação política do país e retomada da força dos trabalhadores

Nesta foto, em destaque o sociólogo Rudá Ricci
Foto: Luiz Braz
O sociólogo Rudá Ricci, mestre e doutor em Ciências Sociais pela Unicamp, e Gustavo Machado, graduado em Ciência da Computação e mestre em Filosofia Política pela UFMG, além de pesquisador do Instituto Latino Americano de Estudos Socioeconômico (Ilaese), abriram, na noite desta sexta-feira (18), a série de palestras programadas para o XI Congresso Ordinário do SITRAEMG, que se realiza no hotel San Diego Suítes, em Uberlândia (MG), e prossegue até domingo (20). Eles abordaram o tema “Conjuntura Nacional e Internacional: desafios para manutenção e administração do serviço público e o papel do Servidor”.

Vivemos uma “dissonância cognitiva”

Para Rudá Ricci, o Brasil, assim como vários outros países, passam por uma crise de representação política, devido à queda da confiança da população. Como resultado disso, citou como exemplo a ascensão de Donald Trump à Presidência dos Estados Unidos, um político de perfil bastante fora dos padrões daqueles que o antecederam no cargo, mesmo os do partido Republicano, legenda considerada de espectro mais à direita da política norte-americana.

Passando para a realidade brasileira, o palestrante afirmou que os brasileiros passam por um momento de “dissonância cognitiva”, que seria a adoção de métodos os mais estapafúrdios, como uma espécie de “fuga da realidade”, para solução das questões. Ele citou como exemplo as várias transgressões às leis cometidas pelo juiz Sérgio Moro nos processos oriundos da Operação Lava Jato e a aprovação de leis inconstitucionais aprovadas pelo Legislativo contra os trabalhadores.
Quanto ao Legislativo, explicou, esse comportamento se deve à ínfima representação da classe trabalhadora na Câmara: são 46, contra 55 deputados da bancada de policiais, 52 dos evangélicos, 257 dos ruralistas e 190 dos empresários. Além disso, com a concentração dos recursos na União, os deputados federais ganharam um poder incomensurável, destacando-se, sobretudo aqueles pertencentes ao chamado “baixo clero”, que estão lá por puro fisiologismo e clientelismo.  “Deputado manda em todos os poderes. Eles são os donos dos partidos. Se quiserem, tiram governos”, ressaltou, acrescentando que os “baixo clero” são ainda piores, pois, sem prestígio, se vendem por migalhas. Daí a lógica de um presidente da República como Michel Temer, apesar dos altos índices de impopularidade, conseguir as matérias mais ácidas contra os trabalhadores.

Além da degradação política, Rudá Ricci apontou também uma mudança na concepção sindical, com as fortes mobilizações dos anos 1980 dando lugar a certa acomodação a partir dos 1990, e sobretudo depois dos governos petistas, em que grandes lideranças sindicais sucumbiram ao poder.
E qual seria a saída? Para os desafios que estão postos, o palestrante apresentou sugestões tais como a rearticulação do campo progressista, reaproximação deste com as bases sociais e sindicais, redefinição do sistema de proteção social no país, superação do modelo de conciliação de interesses e da dependência em relação à comercialização de commodities.

Ao lado de quem estão os governantes?

Gustavo Machado falou sobre as “Finanças públicas e o Judiciário: crise para quem?”, para mostrar a falácia do governo, e que já se tornou senso comum, de que o problema central do País, ao lado da corrupção, são os gastos públicos – e, de maneira especial, os gastos com pessoal.  Exibindo dados e gráficos, o palestrante provou que, embora a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) limite os gastos com pessoal em 50% da Receita Corrente Líquida da União, o percentual relativo a tais despesas vem caindo a cada ano, tendo fechado em 39% em 2017. Tendência de queda que se verifica também em relação às Receitas Correntes, de 29,9%, em 1995, para 20,7% em 2017, e em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) do País, que direciona cada vez mais para baixo dos 10%.
O problema central no País, alertou, não são os gastos com pessoal, mas a prioridade dos sucessivos governos em reservar uma fatia cada vez maior do bolo orçamentário para o pagamento dos juros e amortizações da dívida pública, transferindo, assim, mais da metade do que arrecada anualmente para os especuladores do mercado financeiro. Também se fala que a carga tributária nacional é muito alta. No entanto, relatou Gustavo Machado, a carga brasileira é bem inferior à aplicada na maioria dos países da OCDE (31,9% no Brasil, contra 50,9% na Dinamarca, 45,2¨na França e 44,7% na Bélgica, por exemplo). Mais grave do que isso, no Brasil quem mais paga impostos são os mais ricos, sendo um dos poucos países que não taxa renda e ganhos de capital, e anda diluindo entre ricos e pobres sua maior parte da arrecadação que é originária dos impostos incidentes sobre o consumo.

Gastos com pessoal do Judiciário

Quanto aos gastos com pessoal no Judiciário, detalhou, o percentual desses despesas em relação às despesas primárias da União (fatia inferior à metade do orçamentário, que sobra depois de separada a maior parte para o pagamento da dívida) caiu de 3,28%,em 2010, para 2,23% em 2017.  Há anos, pode-se dizer que vêm sobrando recursos da cota do Judiciário direcionada para pagamento de pessoal, já que embora a LRF imponha um  limite de gastos na ordem de 6,75% da Receita Corrente Líquida para essa finalidade, a destinação desse percentual para o que é efetivamente destinado para este fim vem reduzindo gradativamente, em desfavor dos servidores, fechando em 3,99% no ano passado. Pode-se afirmar que, em valores monetários, a União ficou de pagar aos servidores do Judiciário nada mais, nada menos, do que R$ 110,8 bi de 2011 para 2017.
Para Gustavo Machado, os sucessivos governos já demonstraram que estão do lado do capital financeiro e da iniciativa privada de modo geral. A aprovação da Emenda Constitucional que congelou os gastos públicos por 20 anos, a recente reforma trabalhista e a terceirização, além da tentativa de aprovar a reforma da Previdência, além da dívida pública e da injusta carga tributária, são a prova disso.
Embora observe que esteja havendo certo recuo dos trabalhadores diante de tantos ataques, o palestrante acredita que este é o momento propício para reagir, de mostrar indignação. “Como se nota, os trabalhadores apenas podem contar com sua própria força. É preciso desmascarar os reais motivos de todos ataques em curso e lutar pela manutenção dos direitos históricos dos servidores públicos e dos trabalhadores em geral”, sugeriu.
O coordenador do SITRAEMG Paulo José da Silva conduziu a mesa nessa palestra.

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