Gostaria de compartilhar um recorte de texto para que se possa entender melhor o sofrimento de uma vítima de assédio moral. No texto, o servidor público Makar conta o seu sofrimento e as humilhações no trabalho para uma amiga.
“Pois quer saber o que fez comigo V., este homem maldoso? Dá até vergonha de dizer o que fez; há de se perguntar por que é que ele fez isso? Por eu ser pacífico, por eu ser calado, por eu ser bom. Não era do agrado deles. Por isso puseram-se a implicar comigo. No início, tudo começou com: “O senhor isso; Makar, o senhor aquilo”, e depois passaram para: “a Makar, nem perguntem”. E agora a conclusão: “Ah, mas é claro que foi Makar!”. Aí está, minha filha, como as coisas foram acontecendo: tudo caía sobre Makar! E tanto fizeram que conseguiram transformar Makar em uma espécie de piada em nosso departamento. Como se não bastasse a piada, quase fizeram de meu nome um palavrão. Pegaram para falar até das minhas botas, da minha farda, dos meus cabelos, da minha aparência: nada era do gosto deles, tudo tinha que ser refeito! E olha que isso se repete todo santo dia, desde tempos imemoriais. Eu me acostumei, porque me acostumo com tudo, porque sou um homem pacífico, porque sou um homem sem importância e, para que isso tudo? Fiz algum mal a alguém? Puxei o tapete de alguém? Ou algo assim? Difamei alguém junto aos superiores? Pedi concessões a mais? Levantei alguma calúnia contra alguém? Eu pergunto.”
Se formos fazer uma análise entre assédio e o texto relatado, com certeza podemos afirmar que se trata de um caso de assédio moral laboral.
É sempre bom lembrar o que é assédio moral:
… é uma conduta abusiva, intencional, frequente e repetida, que ocorre no ambiente de trabalho e que visa diminuir, vexar, constranger, desqualificar e demolir psiquicamente um indivíduo ou um grupo, degradando as condições de trabalho, atingindo sua dignidade e colocando em risco sua integridade pessoal e profissional.”
Freitas, Heloani, Barreto (2008)
O assédio moral começa com pequenas implicâncias sistematizadas contra uma pessoa. É o que Makar relata: “No início, começou com o senhor isso, o senhor aquilo”, ou seja, um tratamento pejorativo ao servidor público Makar. Depois vêm os atos de ironia e de desqualificação profissional: “A Makar, nem perguntem…”, ou seja, o início de uma discriminação e isolamento no grupo, sem nenhum motivo aparente. Após, ele foi transformado em piada no departamento, veio a perseguição sistematizada — tudo recaía sobre Makar, que virou o bode expiatório, o alvo dos atos e palavras dos assediadores. Depois vem a implicância com as roupas, botas, cabelo, farda, aparência, ou seja, um ataque direto à autoestima de Makar. A perseguição continua com o trabalho “que nunca era do gosto deles”, tudo tinha que ser refeito e a repetição sistematizada dos atos de assediar — tudo se repetia todo santo dia.
A primeira forma de defesa foi individual: “Eu me acostumo, porque sou um homem pacífico”, já mesclada com as consequências do ataque à sua imagem e à sua honra: — Sou um homem sem importância. Mesmo assim o assediado busca respostas, tenta criar um sentido de tudo o que está acontecendo e, como nos casos de todas as vítimas de assédio, começa a introjetar a culpa. Por não ser como os outros, por estar sendo assediado sem ao menos ter puxado o tapete de alguém, nem tampouco ter difamado colegas junto aos superiores. A vítima caluniada sofre duplamente pois nunca caluniou ninguém e nem pediu concessões ou favores. Assim, o homem Makar está em profundo estado de sofrimento – consequência de todos que sofrem assédio moral. Ele também não entende por que com ele; o que ele fez; por que está sendo tão humilhado.
Não resta dúvida de que é um relato de assédio moral, mas esse texto foi escrito por Fiódor Dostoiévisky em 1846, em seu primeiro livro “Gente Pobre”, que tem como personagens humildes habitantes de São Petersburgo. Em outros contos do autor ele faz uma crítica mordaz ao funcionalismo público da época do Tzar, nos contos: O Sósia, que trata da competência de um servidor e “Um coração Fraco”, já analisado em outro texto meu, que aborda a questão do Burn-out.
Freud, o pai da Psicanálise, tinha uma profunda admiração por Dostoiévisk, o primeiro autor a criar o “romance psicológico”. Pois em Dostoiéviski o fluxo de pensamentos se mistura com as falas e os atos.
Assim percebemos que no serviço público o assédio não é novidade. O que é diferente é que depois dos estudos de Leyman, Hirigoyen e Barreto esse fenômeno tem um nome: assédio moral. E se Makar vivesse hoje o que viveu no texto no ambiente de trabalho, pode estar certo que seria explicado para ele o que está acontecendo: você foi vítima de assédio moral no trabalho.
O SERJUSMIG desenvolve uma política contra o assédio moral e possui um plantão para atendimento psicológico para servidores sindicalizados. Além disso, o servidor do Judiciário tem informação através de artigos, cartilhas, entrevistas, palestras e rodas de conversa. Tem um Sindicato firme e atuante no Combate ao Assédio Moral — fenômeno perverso que causa sofrimento e adoecimento.
Sejam solidários com quem é vítima de assédio moral. Procure seu Sindicato, pois, somente com união e solidariedade poderemos vencer este inimigo invisível — o Assédio Moral.
Arthur Lobato é psicólogo/saúde do trabalhador
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