segunda-feira, 22 de junho de 2020

Ansiedade e depressão em tempos de pandemia



Por Arthur Lobato, psicólogo, responsável técnico pelo Departamento de Saúde do Trabalhador e Combate ao Assédio Moral (DSTCAM) do SITRAEMG.


A depressão é uma doença e também um sintoma de um mundo em ruínas. Este mundo em ruínas tanto pode ser o nosso mundo interno, da subjetividade, quanto o mundo externo a nós, que muitas vezes inviabiliza nossos sonhos e desejos.

A pandemia causada pelo Covid-19 pode gerar em nós desânimo, medo e ansiedade, pois vai afetar nossa subjetividade e a relação com o mundo real, isto é, a forma como nos relacionamos com a natureza e com a vida social.

O carro parado na garagem, a liberdade de ir e vir impedida, como no dilema do presidiário: “tenho todo o tempo do mundo, mas não faço nada”. Em casa, no isolamento social, o tempo passa lento, não se tem vontade de fazer nada, não me interessa atividades lúdicas, trabalho, lives, filmes ou livros. O sono é excessivo ou vem à insônia com pensamentos obsessivos; ideias fixas. Sem poder sair para o trabalho ou para divertir com amigos/amigas, vivenciamos a prisão em si mesmo, a prisão em casa, com comida e recursos, se for da classe média, e em sofrimento e desespero se for subempregado, ou desempregado, habitando em pequenos espaços, com muitas pessoas por metro quadrado, nas favelas, nas casas e apartamentos populares.

Trabalho, ansiedade e pandemia

A realidade do servidor do Judiciário Federal em Minas é o trabalho a distância. O home office compulsório não permitiu ao servidor preparar-se para a mudança da antiga rotina, e de se adaptar a esta nova forma de se trabalhar. São aspectos psicológicos que interferem na produtividade, gerando mais ansiedade, culpa e punição via superego. Temos que entender a queda da produtividade e sua relação com os diferentes ritmos de trabalho em casa, com a família, todos em isolamento social. Como conseguir concentração para trabalhar e desconexão do trabalho no ambiente doméstico?

Muitos servidores e servidoras, produtivos no gabinete, vara, secretaria, cartório ou seção judiciária, em casa não conseguem se concentrar pela dinâmica familiar, pela falta de um espaço para montar um escritório, dividindo computador e internet com familiares, pelos filhos em casa, agitados, sem aula, ou adolescentes entediados, o que aumenta a tensão nas relações familiares.

Temos também um aumento da ansiedade, medo real por causa da pandemia e aumento da ansiedade neurótica, onde o medo excessivo de se contaminar gera o medo da morte, a falta de sentido da vida, a preguiça e a indolência como mecanismos de defesa, já que foi abalado um dos pilares de nossa vida: a rotina do trabalho e de nosso dia a dia. Por isso, ressalto a importância de uma atividade lúdica, de algo que dê prazer e cada um tem que descobrir esta fonte lúdica em si mesmo.

Ansiedade real e ansiedade neurótica

Segundo o criador da psicanálise, Sigmund Freud, a ansiedade é consequência de um conflito interno. Ele difere em dois tipos: ansiedade realística, que envolve a relação com o mundo em contraste com ansiedade neurótica.

“A ansiedade realística atrai nossa atenção como algo muito racional e inteligível, podemos dizer que ela é uma reação à percepção de um perigo externo isto é de um dano que é esperado e previsto”.

Temos, nos dias de hoje, a pandemia como ameaça real à vida, com os contaminados, adoecidos e mortos apresentados diariamente nos dados do Ministério da Saúde e da OMS. Isto é um fato científico, gera medo e ansiedade, por isso temos que nos cuidar e aderir sempre que possível ao isolamento social. Relacionamos um possível aumento da ansiedade realística, por exemplo, quando se analisa os gráficos da projeção exponencial do aumento da pandemia, cada dia com mais mortes.

Na pandemia, a ansiedade realística está relacionada ao reflexo de fuga, que nos obriga a ficar em casa, pois o vírus é invisível a olho nu e mortal, pois não existe vacina ainda. É uma manifestação do instinto de autopreservação, e o isolamento social seria uma fuga do vírus mortal que está nas ruas. As ocasiões em que a ansiedade realística aumenta dependem das medidas tomadas pelo Estado, do conhecimento da pessoa sobre as medidas de enfrentamento da pandemia, tanto no âmbito coletivo como no individual.

Segundo Freud, “o único comportamento vantajoso quando surge ameaça de um perigo seria uma fria avaliação da força da própria pessoa em comparação com a magnitude da ameaça e com base nisto a decisão de fugir ou se defender ou mesmo possivelmente de passar ao ataque, oferece a melhor perspectiva de uma saída bem sucedida nessa situação”. No entanto, alerta o autor, “se a ansiedade for excessivamente grande, ela se revela inadequada no mais alto grau, paralisa toda ação, inclusive até mesmo a fuga em geral a reação ao perigo.”

No caso da pandemia pelo Covid-19, a ansiedade realística pode evoluir para a ansiedade neurótica, o medo é ampliado pela incerteza e insegurança. Um exemplo de ansiedade neurótica é o medo que impede o sujeito viajar de avião. É fato que aviões podem cair, veículos podem se chocar na autoestrada, mas isso não nos impede de viajar. O medo gerado pela ansiedade neurótica paralisa e muitos de nós devemos estar assim ansiosos e ao mesmo tempo paralisados. Afinal, o que devemos fazer?

Segundo Freud “pessoas atormentados por esse tipo de ansiedade sempre pressentem as mais terríveis de todas as possibilidades, interpretam todos os eventos casuais como presságio do mal”. É o que pode acontecer com excesso de informação e as notícias da pandemia. São informações que geram tanto a ansiedade real quanto a ansiedade neurótica, afinal ficam as questões. Quando isso vai acabar? Será que vou sobreviver? Quantos entes queridos vou perder? Suportarei conviver muito tempo com o espectro da morte? Posso ficar em casa ou tenho que sair para trabalhar? Como farei para pagar as contas do mês que vem? Qual o sentido da vida?

Concluindo, de acordo com Freud “a ansiedade realística é uma reação ao perigo, pois onde existe ansiedade deve haver algo que se teme já a ansiedade neurótica, é uma ansiedade expectante ou um estado de apreensão geral, mas onde existe ansiedade existe algo a se temer”.

Tanto nos relacionamentos quanto no trabalho em tempos de pandemia, o importante é o diálogo, pois o outro só tem acesso ao nosso pensamento via discurso. Converse mais, tenha mais paciência, não deixe a depressão e a ansiedade te dominar, não contamine com seus medos as crianças que não tem a capacidade cognitiva e emocional para enfrentar os problemas atuais, pois elas, que são mais vulneráveis, vão se mirar no exemplo familiar para enfrentar os seus próprios medos.

Cabe aos Sindicatos e Federações desenvolverem 5 pontos de lutas em prol da saúde do trabalhador em tempos de pandemia:

  1. Direitos do teletrabalhador como, por exemplo, a cessão de equipamentos, internet, antivírus, acidente de trabalho, doença laboral, entre outros.
  2. Flexibilização da política de metas e produtividade durante a pandemia.
  3. Equipamentos de segurança e higiene para quem está em atendimento externo seguindo os protocolos da OMS.
  4. Combate ao assédio moral e sexual.
  5. Direito a desconexão.

Arthur Lobato
Psicólogo/Saúde  do trabalhador

O DSTCAM, através do psicólogo Arthur Lobato, credenciado pelo Conselho Federal de Psicologia para atendimento online, está realizando os atendimentos via Skype. Agende o seu atendimento virtual pelo telefone: (31) 98959-1320. Para sugestões, dicas e críticas envie e-mail para lobato@sitraemg.org.br


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