quinta-feira, 21 de junho de 2018

Pesquisa conclui que quanto mais nojo juiz sentir do caso, maior será a pena

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Quanto maior a sensibilidade de um juiz à emoção do nojo, maiores as chances de ele aplicar penas mais duras em casos que lhe causem aversão. Uma pesquisa identificou que isso acontece em processos envolvendo rituais de sacrifício de animais e prática de aborto, por exemplo.
Além disso, quanto maior for a sensibilidade ao nojo, maior será a tendência de decidir a favor da inconstitucionalidade de normas e leis, como o projeto de lei que altera o código civil e a lei federal de cotas para estudantes de escolas públicas em universidades federais.
As conclusões são da pesquisa “Casos de Virar o Estômago: evidências preliminares do nojo como fator de influência nas decisões judiciais”, realizada por Rodrigo Tavares, professor de Direito Público da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), e Ivar Hannkainen, pesquisador pós-doutoral da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio).
Para chegar à conclusão que o sentimento do nojo interfere nas decisões judiciais, os pesquisadores aplicaram testes a 65 alunos – 48 alunas e 17 alunos – de graduação em Direito da UFRRJ e da PUC-Rio, com média de idade de 22 anos.
Primeiramente, os participantes preencheram um teste chamado “Disgust Sensitivity Scale”, medida de tendência ao nojo já utilizada em outros estudos psicológicos. O teste funciona como um questionário que mostra a intensidade de repulsa que o participante sentiria diante de determinadas situações cotidianas, envolvendo estímulos do nojo.
Eles também preencheram formulários com dados demográficos e responderam perguntas sobre punições e controle de constitucionalidade, os dois tipos de decisões judiciais que foram analisados pela pesquisa.
Após essa fase, os estudantes tiveram de atribuir penas mínimas e máximas que considerassem adequadas para casos “delicados”. Os participantes também tiveram de realizar decisões sobre a constitucionalidade de leis.


Gráfico relaciona a sensibilidade ao nojo com a duração de punições e inconstitucionalidade de leis
Para um dos pesquisadores do estudo, Rodrigo Tavares, o sentimento de nojo pode ser classificado, no caso da análise da pesquisa, como emoções que possuam relações biológicas e até mesmo culturais com cada indivíduo.
Essas relações biológicas e culturais geram o sentimento de “impureza” quando expostas em situações que envolvam, por exemplo, fluídos corporais, alimentos e até mesmo ações com as quais não estamos habituados. “Demonstramos a tendência de nos afastar daqueles atos que consideramos imorais”, indica a pesquisa.
De acordo com Tavares, os casos estudados na pesquisa, que envolvem homoafetividade, aborto, morte de animais, consumo de psicotrópicos ilícitos e aborto, “tocam diretamente” na sensação de nojo que cada indivíduo possui.
“Com a pesquisa conseguimos concluir, por exemplo, que quanto maior o nojo maior será a tendência de condenar a homossexualidade”, diz Tavares.
Casos recentes
Para exemplificar a relação da pesquisa com casos recentes e reais e a possibilidade do nojo ter influenciado as decisões judiciais, Tavares cita o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que decidiu a inconstitucionalidade da lei cearense que regulamenta a vaquejada, atividade praticada no Nordeste cujo objetivo derrubar um boi com atos violentos aos animais.
Para ele, a diferente sensibilidade ao nojo pode interferir na decisão dos ministros. Tavares explica que, enquanto ministros considerados mais “conservadores” tendem a analisar a vaquejada como algo não degradante, ou seja, com pouca sensibilidade ao nojo, sem a sensação biológica e cultural de “impureza”, os ministros “liberais”, ou “progressistas”, percebem a prática como algo “degradante”.
“Outro caso recente que podemos citar é do homem que ejaculou em uma mulher no transporte público em São Paulo. Essa situação envolve um dos principais causadores de nojo: fluídos corporais. A sensibilidade do julgador influencia na pena mais severa ou não”, explicou Tavares.
Texto: Alexandre Leoratti – São Paulo / Foto: Flickr/sullyphotoagraphy
Fonte: JOTA

Publicado em: http://site.serjusmig.org.br

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