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Rogério Dorneles, médico do trabalho e pesquisador do Rio Grande do Sul |
“Se existe um momento que temos que nos unir, é esse. Do contrário, teremos muitas dificuldades de enfrentar os próximos anos, futuro nefasto para a saúde das pessoas”.
O palestrante iniciou dizendo que não se podem contestar as tecnologias.
Não fossem elas, não haveria a penicilina, a dinamite, o fogo, o avião,
a produção em série, a informática. Contudo, a tecnologia, em si,
depende do que se vai fazer com ela. Passando para o tema proposto,
lembrou que a Reforma do Judiciário, em curso desde o início da década
passada, foi determinada pelo Banco Mundial, através do documento nº
319, de 1996, dentro da política neoliberal de garantir segurança
jurídica e o consequente lucro fácil para as empresas multinacionais
instaladas ou que viessem a se instalar no Brasil. O prefácio do
documento diz: “Necessidade de uma reforma para aprimorar a qualidade e
eficiência da justiça, fomentando um ambiente propício ao comércio,
financiamento e investimentos”. O que foi ditado em relação aos
servidores do Judiciário: “…Os projetos devem preparar o quadro de
servidores, encarregados da parte administrativa das cortes, para
desenvolver o planejamento e a pesquisa necessária a aplicação das
técnicas de gerenciamento processual. Também é importante que as
avaliações sobre o fluxo processual sejam feitas pelas Cortes, como
forma de analisar as questões relacionadas a morosidade, e estabelecer
prazos padrões para processamento de processos e monitoramento
individual do andamento de cada processo”.
O médico gaúcho afirmou que, para atingir
tais objetivos, foram aprovadas mudanças que introduziram o ambiente de
competição nos locais de trabalho, que se explica, por exemplo, coma a
política de avaliação de desempenho, e o controle do tempo de trabalho,
que pode ser explicado pela imposição de metas para desafogamento dos
montante de processos acumulados. É a lógica do capitalismo que
contempla o acúmulo de capital – e poder – na mão de poucas pessoas e o
pagamento de salários cada vez menores para os trabalhadores. No
Judiciário, isso se traduz com o pagamento de salários cada vez mais
altos e reajustes diferenciados para os magistrados, enquanto os dos
servidores são bem inferiores e revisados por índices bem abaixo da
inflação. “O valor auxílio-moradia dos magistrados é mais alto do que o
salário de um professor universitário”, comparou, fazendo a seguinte
observação: “Quem será atingido por isso: a gente tem que ter claro o
papel que a justiça cumpre em qualquer parte da sociedade”.
Passando
para a análise sobre os impactos negativos da implantação do PJe sem as
devidas adequações da estrutura da estrutura e do quadro funcional dos
órgãos do Judiciário, e o necessário treinamento para os servidores,
avaliou que, para o cidadão, essas inadequações trouxeram prejuízos como
demora, menos atenção ao processo e insegurança, pelo fato de as
decisões serem pré-definidas nos níveis superiores. Para os magistrados,
servidores e advogados, o trabalho monótono, cansativo, com pouco
espaço para a criatividade, a insatisfação e, consequentemente, o
adoecimento.
Pesquisa feita nos
tribunais, comparando a situação de servidores que trabalham com PJe
desde 2004 com a daqueles que trabalham preponderantemente com o sistema
virtual, apontou percentuais muito superiores de adoecimento entre o
contingente de servidores que passaram a lidar com o processo
eletrônico. Foram avaliados o grau de adoecimento em doenças
oftalmológicos (dor e ardência nos olhos, ressecamento, cansaço etc.),
osteomusculares (pescoço, costas, ombros etc.) e sintomas psíquicos,
sendo detectado também um aumento assustador de consumo de medicamentos
entre esses servidores, sobretudo de antiinflamatórios,
ansiolíticos/calmantes, remédio para dormir e antidepressivos. Aumentou
também o grau de desmotivação, em decorrência também de toda a pressão
pelo cumprimento de metas, com a maioria dizendo que trabalha mais pela
estabilidade no emprego e pelo salário do que, por exemplo, pelas
perspectivas de crescimento/reconhecimento e valorização ou pelo o
conforto do ambiente físico.
Algumas
das formas de enfrentar esse processo de controle imposto pelo Banco
Mundial e pelo neoliberalismo sugeridas pelo palestrante: impedir o
avanço da luta antissindical e fim do direito de greve; lutar contra a
retirada de direitos, contra o assédio moral e toda sorte de
discriminações, e pela democratização nas relações hierárquicas; avaliar
se o centro da luta reivindicatória deve centrar-se apenas na questão
salarial; saber com o que se está lidando, pois o poder do capital é
imenso no momento atual.
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O médico Rogério Dorneles (segundo a partir da esquerda), ao lado dos também palestrantes professor Roberto Heloani e os psicólogos Márcio Roberto Santim e Arthur Lobato |
No espaço para
debate, Dorneles disse que os médicos dos tribunais, como qualquer
outro, têm que examinar e ouvir o paciente, para ter um diagnóstico real
de sua saúde. E manifestou sua preocupação diante do fato de muitos
cidadãos do País super graduados não “pensarem”, viverem alienados. Na
sua concepção, é preciso discutir a organização do trabalho. “As
pessoas, de modo geral, não gostam de perder tempo e aprender a se
reunir, a ouvir para trocar informações”, lamentou.
Publicado em: http://www.sitraemg.org.br
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