sexta-feira, 6 de maio de 2011

Assédio moral abre debates de seminário em Brasília



Iniciando os debates do primeiro dia do 3º Seminário Nacional de Processo Administrativo Disciplinar, o especialista em Direito Constitucional Claudio Rozza, que também é Auditor-Fiscal do Estado do Paraná, abordou nesta segunda-feira (2/5) os “Limites legais à possibilidade de assédio moral no âmbito dos deveres e proibições estatutárias incidentes nas relações funcionais (assédio moral, assédio sexual e distúrbios psicológicos)”.

Na oportunidade, o painelista lembrou que a condição da autoridade fiscal é a de viver no limite da imposição e que, no imaginário popular, o Auditor não é o assediado, mas o predador. Rozza abordou também os riscos físicos observados numa avaliação psicológica. “O assédio moral vem porque ele é um lado negativo ao equilíbrio e ao meio ambiente sadio no trabalho. Trabalhar com estresse não vale a pena. Mata”, disse.

Ele também mencionou que a baixa auto-estima e o suicídio são muitos dos desdobramentos fatídicos pelos quais passam aqueles que se sentem acuados no meio profissional, além dos danos mais frequentes que podem ser diagnosticados no dia-a-dia. “Se a gente for observar as consequências do estresse provocado em um ambiente de trabalho que não é sadio, qualquer um vai se achar vulnerável a algumas dessas circunstâncias como depressão, bipolaridade, estresse, uso de drogas e alcoolismo. Sujeições que causam, inclusive, muitas licenças e até abandono de cargo”, enfatizou.

O especialista ressaltou que outro problema do assediado é provar, sem a existência de uma testemunha, que sofreu ou está sofrendo pressão moral. “Eu posso conseguir por meio de laudos psiquiátricos comprovar que eu não estou bem, agora qual é o limite da situação para dizer que isso decorreu de atos daquele que me assedia?”.

Já o segundo painelista, advogado e especialista em Direito Disciplinar Léo da Silva Alves, começou sua explanação baseada em um trecho de um livro escrito pelo ex-ditador do Iraque, Saddam Hussein: “Todo aquele que decide o destino de outro não pode perder de vista o Direito, o sentido de humanidade, a honra dos indivíduos e os interesses da pátria." A intenção do especialista foi justificar com esse exemplo que nem sempre o que se escreve - já que se tratava de um ditador - segue o que preconiza, na prática. "Sabemos que entre o ideal planejado e a realidade há diferenças. Assim acontece nas relações do serviço público dotadas pelas melhores intenções das doutrinas, da lei, na esperança de que funcione”, completou.

O advogado acrescentou que, de acordo com a Organização Mundial do Trabalho, 8% dos trabalhadores nos espaços públicos e organizações privadas são consideradas vítimas do assédio moral. Ele definiu bem as características do problema. “Gestos, atitudes que afetem a personalidade, a dignidade, a integridade física ou psíquica do trabalhador são alguns comportamentos que podem ser definidos como assédio moral. Há também a relação direta de sentimentos de tristeza, angústia e amargura. Algo parecido ao bullying, que é o assédio moral no ambiente escolar”.

Léo da Silva Alves dividiu em três categorias o assédio: descendente, em que a chefia transforma em vítima o subalterno; ascendente, em que um grupo se reúne para isolar e, consequentemente, derrubar, a chefia; e o paritário, que ocorre no mesmo nível hierárquico e se configura quando um grupo prejudica um colega, muitas vezes por inveja.

“O fato é que o assédio moral está muito associado à psicopatia, à sociopatia e à figura do narcisismo. São distúrbios de personalidade e, via de regra o agressor é um fraco de espírito, de moral, de valores e de competência”, enfatizou o painelista.

Efeitos psicológicos – Os transtornos psicológicos foram o foco do painel “Assédio moral no serviço público”, conduzido pela psicóloga Leila Janot de Vasconcelos e pelo psicólogo, jornalista e coordenador da Comissão de Combate ao Assédio Moral do sindicato dos Servidores da Justiça de 1ª Instância do estado de Minas Gerais, Arthur Lobato.

A especialista começou o debate ressaltando o conceito de assédio moral e da síndrome psicossocial multidimensional, que advém do assédio. Segundo a psicóloga, a síndrome se configura por um complexo de sintomas físicos e psíquicos específicos e inespecíficos não redutíveis a uma configuração típica ou não facilmente diagnosticável. De acordo com a explicação, ela se origina e se desenvolve permeando e afetando todos os níveis hierárquicos da organização e também com importantes repercussões externas.

Leila também citou as fases do assédio que incluem as etapas do conflito, da estigmatização, da intervenção da empresa, com solução positiva ou negativa do conflito, e a fase de marginalização ou exclusão da vida laboral.

As estratégias de que o opressor lança mão envolvem, segundo Janot, o limite à comunicação, limite ao contato social, o desprestígio da pessoa perante os colegas de trabalho, entre outros. “As pessoas geralmente procuram situações sem testemunha e sem ficar caracterizada a real intenção dela, o que permite a dificuldade de se provar esse tipo de violência. Isso constitui uma questão psíquica muito forte porque o vitimado pode acreditar que mereceu aquele tratamento por algum motivo”, ressaltou a psicóloga.

O assédio moral, segundo ela, afeta o equilíbrio emocional das pessoas e altera seu modo de se relacionar com o mundo e com quem está ao seu redor, causando insegurança, baixa auto-estima e sentimento de impotência. “Saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social. É necessário coerência naquilo que se sente, pensa e faz. Se você sente um conflito, pensa uma coisa e faz outra, fica tão desestruturado que tem um comportamento que não tem nada a ver com a sua atitude, mas de tanto repetir passa a fazer parte do repertório”, enfatizou.

Por último, o jornalista e psicólogo Arthur Lobato endossou as explanações da expositora que o antecedeu, e, emendou dizendo que assédio moral está intimamente ligado às exigências do trabalho globalizado que acarreta impactos sobre a saúde do trabalhador por estar associado à competitividade, ao individualismo, à produtividade, entre outros.

O pesquisador em saúde do trabalho falou ainda das consequências do assédio moral na saúde. “O aliciador vai dizer que assédio não existe e que a pressão faz parte do jogo do capital financeiro. E em busca da produtividade ele pratica o assédio moral. Mas a pessoa, com muita pressão, começa a construir um quadro diferente, pois tende a tirar mais licenças, ter queda de produtividade, esgotamento físico e emocional, mudança de setor, etc”.

O papel do sindicato como mediador e defensor do seu filiado foi lembrado pelo psicólogo. “As denúncias ao sindicato vão mostrar que pequenos problemas de relacionamento revelam mal-estar no trabalho. Elas servem como instrumento para intervir no modo de produção da empresa ou instituição”.

Outras estratégias que ajudariam a evitar o assédio moral seriam fazer alianças com colegas e evitar conflito direto com o assediador. Mas, caso seja vitimado, o Auditor pode começar a levantar provas a seu favor como fazer um dossiê com documentos, bilhetes, atestados e exames médicos. Também é importante anotar em um caderno com páginas numeradas as palavras, os atos de assédio e o nome das testemunhas. “Temos de agir na fonte da raiz porque o assédio moral é como uma doença e requer prevenção”.

O painelista vai disponibilizar o material apresentado no seminário nos próximos dias para consulta dos filiados interessados.

Segurança jurídica – Durante a solenidade de abertura, o superintendente da 1ª RF (Região Fiscal), Auditor-Fiscal José Oleskovicz, parabenizou a iniciativa do Sindifisco Nacional e da DS (Delegacia Sindical) Brasília na realização dos debates acerca do assunto que, segundo ele, são importantes para proporcionar segurança jurídica.

Ele citou vários pontos dentro desse meandro que poderiam ser aproveitados durante os dois dias de evento pelos Auditores-Fiscais. “Hoje temos auditoria patrimonial, cada vez mais ampliada, mas aí está a preocupação. Essa investigação disciplinar diante da legislação permitiria acesso a informações fiscais dos servidores. Algo que também tem ocorrido trata da infração tributária cometida por servidor. Nesse caso, ele deve ser tratado como contribuinte ou como servidor?”, disse.

O superintendente finalizou sua participação defendendo o princípio da legalidade, do contraditório e da defesa de uma corregedoria sólida. “Temos de respeitar esses princípios para construir uma Receita com mais segurança aos servidores e à sociedade”.

O presidente da Anfip (Associação Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil), Jorge Cezar, também mencionou a oportunidade para tratar dos temas. Já o presidente da DS/Brasília, George Alex Lima de Souza, traçou um panorama do que espera para os dois dias do evento: “Esse seminário tem a responsabilidade de abordar as problemáticas, mas deve apontar rumos e quebrar paradigmas como, por exemplo, do papel da Corregedoria nesse processo”.

A falta de autonomia da Corregedoria também foi o tom da fala do presidente da Fenafisco (Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital), Manoel Izidro dos Santos Neto. Ele disse que a Corregedoria muitas vezes vem vinculada ao gabinete da secretaria da Receita, do Ministério da Fazenda, e pode ser utilizada como ferramenta de perseguição laboral.

Encerrando o ciclo de explanações na abertura da solenidade, o presidente do Sindifisco Nacional, Pedro Delarue, afirmou que é necessário distinguir o debate sobre assédio moral do trabalho realizado pela Corregedoria. Ele explicou que o Sindicato, como um dos incentivadores da criação da Corregedoria da RFB, tem também a responsabilidade na discussão do seu funcionamento. “Ela não é um instrumento de assédio moral, mas pode ser se for mal utilizada. E hoje estamos comemorando o dia de luta contra o assédio moral no trabalho e nada mais adequado do que discutir como se combater e evitar esse mal a qualquer custo”, disse.

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